terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Passos Que Foram Os Meus



Cabeça erguida caminho o meu caminho
Por piso incerto enxameado de percalços
Exausta no meu caminhar
E afundada num mundo de contradições
Tenta-me o desafio da mulher de Lot.
Determinada paro e olho para trás
Não sinto perigo que se intrometa comigo
Mas a faculdade de ver os caminhos que caminhei
De discorrer das dúvidas que decifrei
Tornou-me ciente da minha missão
Do certo das minhas decisões
Com transparente luz
Fez-me ver a rota que foi a minha
Algumas alegrias que conheci
Mas mais, bem mais do que isso
Todas as lágrimas que chorei
As mil dores que senti
Mas chegada que me sinto ao cume da montanha
Inspiro bem fundo
O sentir da prova ganha

Olema



Terras de Vera Cruz


Amo-te terra distante
Que da minha algum dia foste o Cais
Quero-te com a força do amante
Pátria de Vinicius de Moraes

Canto-te amazónia sem par
Pulmão desse Brasil gigante
És oceano verde és mar
Berço de justo orgulho, galante

És irmã da Lusitana Terra
Do meu berço de embalar
Dos meus avós foste quimera
Foste mundo do seu sonhar

Eu te canto nesta hora
A minha saudade contida
Crê que dentro de mim mora,
Sonho que é de uma vida


Olema



Dia da Criança




Nesta manhã radiosa de belo dia promissora

Em que do cuco o canto se escuta virginal

Pressinto a aurora sonhadora

No seio trazendo delírios de Natal



O que eu canto nesta manhã de esperança

É obra mais cara que a natureza teceu

O sorriso inocente de uma criança

Envolto na beleza que o Criador lhe deu



Olema


Reflexão


Todos os dias desperdiço a oportunidade de olhar alguém nos olhos.
Quando o faço com olhos de ver, sinto-me enriquecida ao pensar que estamos embarcados no mesmo barco, que a nossa rota é a mesma, que é o mesmo o tempo da nossa viagem.


Olema


Felicidade




Eu esfalfo-me por ser feliz

Na riqueza vislumbro essa sorte

E no receber vejo claro o norte.

Mas o equívoco me atormenta

E faz-me ver caminhos de desnorte.

Desperto de sono profundo

Com os olhos da alma passo a ver

E ao longe a verdade focar

E vejo que bem mais do que no receber

A felicidade está no dar




O Poder da Palavra


Quem me dera a mim ter
Dentro das mãos o poder
De do mundo ser senhora

Faria justiça a preceito
Ganharia sempre o pleito
Do leão a domadora

Enterrava o ódio bem fundo
Eliminava o corrupto do mundo
Que do poder não dava mão

Pugnava pela sobriedade
Fomentava a solidariedade
Para todos haveria pão

Mas dentro das mãos eu não tenho
Esse poder que detenho
No esconso da minha mente

Mas o facto de assim pensar
Essa verdade de sonhar
Faz-me caminhar em frente

A palavra é poderosa
Tem força viril e a cor da rosa
É de um mundo novo a semente.

Olema


Alvorada


O dia esvai-se no poente
A solidão de mim se abeira
Sede de vida em mim latente
Mas outra é a vertente
Que ao sol estende a esteira

Mas o tempo é de bonança
E da noite não tenho medo
Os ventos são de mudança
As constelações são faiança
A alvorada bem cedo

A solidão assim afronto
Expurgando o meu receio
Comigo feito o confronto
Um dia novo apronto
E nele sinto novo esteio

Da noite despi os segredos
Retomada a confiança
O luar extinguiu meus medos
E da frescura dos vinhedos
Chegam até mim enredos
Murmúrios de esperança

Olema



A Cabana Dourada

A CABANA DOURADA




Na senda do prestigio
Orientei meus passos
Na rota do sucesso
Depus o meu porvir.

A felicidade senti
Acercar-se de mim
Ofertar-me guarida
E proventos mil.

De uma cabana dourada
Cuidei dominar o mundo
Mas fui demasiado fundo
No meu ousado sonhar

É que nessa cabana vil
Só encontrei solidão
De vermes vi mais que mil
Morte desilusão

Arrependida me senti
De tão alto sonhar
Depressa me decidi
Àquela que sou regressar

Dentro de mim encontrei
A minha perdida alegria
E assim num repente
A noite se fez dia.

Olema


Se...

Se…



Cerrando os olhos, qual contradição, entro dentro de mim e surpreendo-me.
É como se da primeira vez me auscultasse, me perguntasse quem sou e ao que venho. Subitamente senti-me infinitamente importante, ou melhor, obrigada a sê-lo.
Abri os olhos levantei-me e vou tomar caminho.

Olema


Monólogo

MONÓLOGO

Eu sou um pedaço de tempo
Senhor de um espaço que é só meu
Eu sou lampejo, eu sou relâmpago
Luz que mal brilha
No portentoso escuro do céu
Eu sou a pobre que demanda
Dádiva não material
Eu sou aquela que sonha
E ansiosa busca o definitivo
A perseguida resposta
O porquê do existir
O pressentir que no fundo de si
Discretamente oculta
Mora actuante a razão.

OLEMA


domingo, 31 de outubro de 2010

Hino à Criação

Hino à criação



Inscrita ficou uma lei na natureza
Conferindo-lhe venturosa eternidade
Essa lei que enche de grandeza
A térrea condição da humanidade

Graças a ela algo de grande acontece
Qual rugido sonoro de um leão
É um milagre cuja feitura tece
A força indomável da criação

Três tesouros me foram assim ofertados
Nascidos de providenciais fetos
São para mim seres abençoados
Tornados razão de ser, meus netos

Bia, Chalo e Matita se chamam
Bendita dadiva do Criador
Entes que hoje de mim recebem
Justo punhado do meu amor

Olema

Saudades de Africa

Saudades de África



Hoje é noite de recuar no tempo
Imperativo que nasce de espontâneo crer
Inesperado impulso nesta hora acalento
Regressar a um remoto, distante viver.

Saudades vivas desse tempo de há muito
Dilaceram hoje a minha lembrança
Viajar ao passado é penoso, eu o sinto
Vale-me que brote sempre em mim a esperança

De África guardarei eternamente os cheiros
Os Pôr do Sol, a humana convivência
Terra de fartura, dos cafezais e coqueiros
De um povo sofrendo ancestral dolência

De Luanda guardarei eterna saudade
Onde vivi minhas horas de adolescente
Num profundo assomo de verdade
Mora em mim um sonho de África, latente

De África guardo hoje a nostalgia
Do Africano a bondade patente
Aceso o sonho de voltar lá um dia
Regressar no tempo é sonho premente

Do vasto oceano imenso e profundo
Respiro hoje ainda a suave aragem
Da baía de Luanda, extremado mundo
Ah, como guardo indelével a imagem!

Olema

sábado, 23 de outubro de 2010

Em busca do filho pródigo

Em busca do filho pródigo


Está escura a noite
Mas falam-me as estrelas
Paradoxal linguagem
Que me esforço por entender
Há arritmias no tremular
Porque há uma estrela
Que tresmalhada
A todo o transe
Me esforço por encontrar.
De tanto buscar, de tanto procurar
Subitamente
Sinto-me feita corpo estelar.
No corrupio tremulante das estrelas
Transponho a Via Láctea
E repouso em Orion
E como a buscada estrela não encontro
Triste, desolada
Regresso à terra
Minha terra,
Com ímpetos não sonhados
Mas uma voz sussurrando-me
Que há sempre um espaço para a esperança
Que mora no mais recôndito
Do coração de uma mãe.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Aquela que eu sou

Aquela que eu sou



Serei filha do gene
De algo que a olho desarmado
Simplesmente não vê

Serei filha de um átomo
Microscópica porção
Da térrea matéria

Serei filha do acaso
Da não vontade
Do simples aconteceu

Serei filha de Marte
Se de Marte algum dia
Partícula à terra desceu

Serei filha da lua
Dessa nívea esfera
Que desde sempre me atrai

Desse hino à noite escura
Que nos fala e murmura
Romântico pedaço de céu

Porventura filha da vontade
Do querer determinado
De alguém que deveras amou

Sim eu sou filha de tudo
Do gene, do átomo, da porção
Do acaso, do amor e da lua

Mas muito das circunstâncias
Do acaso e do amor
-Da vontade do Criador.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Há um ser dentro de mim

Há um ser dentro de mim



Às vezes regresso no tempo
Ou é o tempo que regressa em mim
De repente sinto-me criança
Sentimento que
Enternecidamente acarinho
Porventura a criança
Que em mim habita
Que tem morada em todos nós
Valiosa herança de nossos avós
Porque mistério impenetrável
Na sua vida eu vivi
No seu sentir eu senti
Pelo seu ser passei
Num passo adiante que dei no tempo
Emergi das cinzas
Consciente de novo me fiz
Mas esse ente
Que dentro de mim mora
Às vezes sinto-o soltar-se
Mas nunca perder o modelo
Que lúcido em mim vê

Contradições

Contradições



A Natureza às vezes desconcerta-me
Apesar da seriedade que sempre põe nas suas leis.
É fácil deslumbrar-me com ela,
Que na primavera renasce, floresce
Como que saindo do frio, da morte.
Desconcerta-me constatar que os lírios do campo
Prenhes de simplicidade e beleza
Brotam espontâneos da mãe terra mas vivificadora.
Os próprios pântanos florescem
E da penedia brota numa alegoria impar
O pascal rosmaninho
-Escatológico processo
Que a beleza arranca à fealdade
Parecendo dar lógica ao absurdo.
Misterioso caminho que num ápice
Me transpõe para outros parâmetros
Do insondável mistério que é viver
Mistério que faz com que a vida de uma criança
O brilho dos seus olhos
O despertar da sua inteligência
Possam ser produto de um acaso sem sentido
Sem a marca do amor autentico
Sem o mínimo senso que a paternidade exige.
Neste navegar no mar dos afectos
Na riqueza do bem querer mais profundo
Estranho é que o absurdo
Se sobreponha ao bom senso.
Sim, desconcerta-me que o homem inteligente
Perca o sentido do essencial
Dos valores que dão sentido à vida
Daquilo que verdadeiramente justifica
E dá sentido
Aos mais transparentes propósitos.

27/04/2009

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Apesar de tudo

Apesar de tudo



Apesar das dores, do sofrimento
Que tantas vezes se derramam sobre os nossos dias
Apesar do absurdo feito cantaria
Que faz as horas
Que constroem o nosso tempo
Apesar de tudo, do aparente nada
Que tantas vezes parece traduzir-nos a existência
No projecto não conseguido
No desamor ou na incompreensão
Apesar de tudo, da aparente negação
A que parece reduzir-se
Da nossa vida a construção
Apesar de tudo, procuro fazer do meu existir
Um hino constante á alegria

domingo, 12 de setembro de 2010

Poemas de meu pai

Há mais de setenta anos que um caderninho de poemas da autoria de meu pai corria risco de extravio, viajando de gaveta para gaveta, de casa para casa, até que foi recuperado em pleno lixo. Era só mais um dia e nunca mais dele ninguém teria conhecimento.
Constituindo hoje uma preciosidade para mim, o seu extravio ou destruição seriam uma perda irreparável. Devo a este encontro com o espírito poético (que nunca sonhara) de meu pai a minha entrada, justamente há um ano, neste site, o que considero ter acontecido em boa hora, por me proporcionar momentos e leituras gratificantes.
É com este espírito que hoje torno público mais um desses poemas, homenageando o seu autor (aliás poema de «mal de amor»).

Antes de passar aos belos poemas do meu pai, gostava de citar 2 poemas meus, onde expresso o grande sentiento de saudade e amor que sinto por ele.

Vivência

Orgulhosa sinto de meu pai o engenho
Recordá-lo inveterado sonhador
Saudades muitas na minha alma tenho
Dentro de mim o gene do seu amor

Deixa que num doce enlevo, ternamente
Te cante homem sofredor
Tua memória recorde em canção dolente
Revivendo o teu verso criador.

Pensando em ti

Quando rememoro o meu tempo de criança
E regresso aos primórdios do meu ser
Quando no desalento agarro a esperança
E de novo a vontade de viver

Nessa hora meu pai eu penso em ti

Quando no devaneio da adolescência
O sonho de mim toma conta
E do teu amor a carência
Ao longe, muito longe, desponta

Nessa hora meu pai eu penso em ti

Quando dos meus dias responsável
Caminho na estrada da vida
E dentro de mim só pensável
Do adverso vislumbrar a saída

Nessa hora meu pai eu penso em ti

Agora na idade madura
Em que para trás o tempo diviso
E dentro de mim murmura,
Sussurra do tempo o siso

Nesta hora em que o tempo vislumbro
Que com o belo da vida me deslumbro

Nesta hora meu pai
Como hei-de não pensar em ti?

Olema


Poemas de meu pai:

(Terra natal de meu pai-Mirandela)

Amor constante

(Poema escrito na aldeia de Mascarenhas).



Como foi grande o apaixonado afecto,
Que por ti senti em horas d’amargura.
Como eu amava o teu perfil dilecto,
Que me fez sonhar momentos de ventura.

Como eu sofri ao conservar-me quieto,
Gemendo, ao ver doutro, tua alma pura.
E como sofre meu coração inquieto,
Pulsando por ti com estranha loucura…

Ainda agora apesar de mui distante,
Guardo em meu peito teu perfil galante,
Entre amor imenso e saudade atroz.

Mas tudo envolvido pela incerteza,
Escreve-me; dá-me a boa ou má certeza,
Se serei amado, sim ou não, por vós.

(Soneto)


Chama saudosa















Como vai já longe minha infância risonha,
Que eu quisera outrora que não tivesse fim!...
Foi um sonho leve que a gente apenas sonha,
Para findar depois como findou em mim…

Deixando-nos, somente, recordações saudosas,
De quiméricas visões que o tempo enevoou…
Óh, utópicos devaneios; Óh, coisas vaporosas,
Que minh’alma pobre tanta vez sonhou.

Correi: Vinde outra vez minh’alma acalentar,
Aquecei meu peito frio, triste e sofredor,
P’ra que antiga alegria lá possa voltar…

Mas nem assim se alegrará; sei-o muito bem,
Porque me falta a chama dum sincero amor;
Porque me falta a luz do amor duma Mãe!...


Divagando






Nestas noites estivais de viração amena,
Em que toda a gente sai a passear.
Eu, francamente, sinto muita pena,
De não poder contigo adormecer, sonhar…

Sonhar, sonhar lá pela noite adiante,
‘te despontar a rútila alvorada.
Eu sonharia uma ilusão distante,
Ilusão d’amor por mim arquitectada.

E eis porque lastimo esta sorte dura,
Que calcina deveras, minh’alma pura,
Lançando-a com força para a vil paixão.

Desculpa-me tu, esta grande ousadia,
Mas sempre altivo, só na morte ímpia,
Perderei a esperança ao teu coração.


Um dia



















Um dia contemplei-te meigamente,
E fiquei com desejo de merecer-te.
Amor, talvez, porque depois ausente,
Virá o desejo de voltar a ver-te…

Para saciar aquela saudade,
Que atingirá meu coração em parte.
Para ver teu rosto, reflectir bondade,
P’ra com mais força, continuar a amar-te.

Para, enfim, amar-te, loucamente,
Fazer a vontade ao peito fremente,
Onde pulsa por ti meu pobre coração.

E eis aqui o soneto particular,
E se o autor não quiseres amar,
Dele, pelo menos, não te esqueças, não!...


Beijar
















O beijar não é pecado,
Diz um velho rifão…
Quanto mais um beijo dado,
Como prova d’afeição.

Pedi-te um beijo,ó moça,
Negaste-ma tua face.
Só desejava por força,
Que esta paixão passasse.

Agora com grande pena,
Não deixo de te ter amor…
Porque os teus olhos, pequena,
Têm um brilho encantador.

E finalmente estou triste,
Porque não sei que fazer.
Se continuar como viste,
Ou procurar esquecer…


Gratidão


















Sou teu humilde colega,
Feliz em te conhecer…
Minh’alma grata fumega,
A gratidão por teu ser.

Sinto por ti gratidão,
Grata amizade também.
Porque a minha ingratidão,
Pagaste-ma tu com perdão,
Quando morreu minha mãe.

Tenho por ti amizade,
E devo-te muitos favores.
Mesmo com tua bondade,.
Até mataste a saudade,
Aos meus antigos amores.

Sinto por ti uma paixão,
Que me custa a sufocar.
Está preso teu coração,
Mas quando livre, então,
O meu te saberá amar.

Gosto de ti, finalmente,
Só te peço um favor.
Que tenhas sempre na mente,
O perfil deste inocente,
Que te admira com fervor…

E que na sua pobre vida,
Toda feita de bondade.
Precisa d’alma sentida,
Que lhe ajude, nesta lida,
A matar a saudade!...

(Poema que o meu pai dedicou a uma colega sua)


Võo d'Alma














Já longe, quando o carro se sumia,
Contornando os pinhais, serenamente,
Inda avistava eu, minh’alma ardente,
Que atraz do carro, para ti corria…

Já o crepúsculo que se segue ao dia,
Tomara a vida, muito meigamente.
E no meu ser, ficara inda ausente,
Essa louca alma que me pertencia…

Mas que fugiu; voou p’rá minh’amada,
Quebrando velhos laços d’amizade,
Com a rapidez d’alma apaixonada.

Ai!... A partida dela e do meu amor,
Deixou meu coração com saudade,
E o meu ser na mais profunda dor


Soneto




















Vede d’outrora o que transparece apenas,
Neste modesto livro que consegui formar.
Um coração cansado, repleto de penas,
Por não ter alguém, a quem sincero amar…

Uma alma rude que em noites amenas,
Ao mundo das quimeras me soube levar.
Quando d’alguém; bênçãos às centenas,
Minha infantil vida, vinham animar.

Afinal, um pobre ser muito magoado,
Vivendo neste orbe, sempre abandonado,
E com saudades indeléveis d’alguém…

D’alguém que com loucura m’estremeceu,
D’alguém que m’abençoou quando morreu…
D’alguém, infeliz como eu… de Minha Mãe!...


Um sonho















Sonhei, que nos teus lábios sorveria,
Distância dos mares que percorreste.
Sonhei, que d’entre os abrolhos sairia,
Pelas esperanças que tu me concedeste.

Sonhei, que nos teus lábios aspiraria,
A brisa ardente da terra onde nasceste.
Sonhei, que junto a ti eu viveria,
Muito feliz porque me compreendeste.

E sonhei, que junto a mim sempr’estava,
A mulher que eu outrora já amava;
A mulher que, em silêncio, sempre amei…

Mas…Óh dura desilusão que me vai ferir,
E me fará sofrer, porque tu vais partir,
Deixando-me apenas, sonho, que eu sonhei!...

(Poema que o meu pai dedicou a uma colega brasileira)

Coração Errante



















O meu coração errante
Aportou à tua porta…
E quis reviver a distante
Ilusão talvez d’amante
Mas afinal quási morta.

E reviveu com saudade
Horas que não voltam a sorrir.
Os meus laços d’amizade,
Que para contigo beldade,
Jamais se hão-de partir.

E num momento reviveu
Todas as nossas relações.
Ai!...Infeliz coração meu…
Nem já sei quanto sofreu,
Ao recordar ilusões…

Agora pobre coração,
De que te serve o carpir?...
Se no fim do ano, então,
Partirá teu coração,
Querida colega - a fugir…

Depois um pouco distante,
Lá onde habitam teus pais.
Não ouvirás dissonante,
A voz deste estudante,
A suspirar e aos ais…

E continuará a errar,
Qual judeu débil, cansado.
Exausto de procurar,
Uma alma que saiba amar,
Meu coração malfadado…


Mulher Ingrata


















Cruel mulher que eu amei,
Ingrata por quem chorei,
Pranto imenso de dor…
Porque tu me falseaste,
Ingrata m’enganaste,
Repartindo o teu amor…

Que eu julgava só meu,
E que finalmente morreu,
Nas sombras desta ilusão.
Coração aniquilado!...
Evoca só um bocado,
Dessa funesta paixão.

Evoca inda a história,
De bem triste memória,
Para ti coração meu.
E verás como é triste,
Quem no mundo resiste,
Aos embates como eu.

E tu mulher assassina,
Inconsciente e ferina,
Do meu puro amor troçaste.
Fizeste vergar por terra,
O leal peito que encerra,
Meu coração que enganaste.

Não te lembras? Oh ingrata!
Daquela paixão que mata,
Que me invadiu a mim?...
Pois eu vejo bem em ti,
A mulher por quem sofri,
Para me fazeres assim!...

…Roubando-me a alegria,
Destruindo-ma um dia,
Com teu olhar traiçoeiro.
Com essa tua traição,
Deixaste-me desde então,
No mais duro cativeiro.

Aniquilado pela dor,
Meu coração sonhador,
Assim vive despresado.
Mas imerso em bondade,
Porque na humanidade
Todos nós temos um fado.

Que nos conduz vida fora,
Desde o berço – a aurora -
‘Té ao crepúsculo da vida.
E o fado de um desgraçado,
Que amou sem ser amado,
É uma canção sentida!...

Que o pobre vagabundo,
Entoa por esse mundo,
Em busca de sorte bela.
Mas quem nasceu malfadado,
À sorte já abandonado,
Não pode fugir a ela!...

Resta-me apenas cantar,
Em versos a soluçar,
A sua ilusão perdida.
E há-de mesmo sofrer,
Sentindo as outras gemer,
Através da sua vida.

Eis em sofríveis versos,
Meus pensamentos imersos,
Em ondas de desalento.
Com tua traição mesquinha,
Lançaste a vida minha,
Num horrível sofrimento.

Eu penso com amargura,
Que herdei a desventura,
Da minha pobre mãezinha.
Oh!...Coração torturado!...
Se esse é o teu fado,
Cumpra-se a sina minha!...


Quadra



















Vêde do passado o que me vai ficando,
A alma dolorida por não poder amar.
A ideal mulher que eu vinha sonhando,
Desde a minha infância – meu perdido lar…

Recordações

















Minha mãe! Pobre mãe!...Então não te recordas,
Daquele ente d’outrora, que acalentaste?!...
Minha mãe! Minha mãe! Já nem sequer acordas,
Para ver teu filhinho, que tu tanto amaste!...

Não te recordas dele, crescendo também,
Abençoado por ti, a todos os momentos?!...
Acorda!...Abençoa-me agora, minha mãe,
Alivia ao filho teu, estes seus sofrimentos!...

Mãe!...Oh!... Não te recordas, de quando o destino,
À cova te arrojou, á terra fria, ao nada?...
Eu chorei, evoquei meu tempo de menino,
Com a alma saudosa e mui dilacerada!...

‘Te agora na penumbra, triste, do meu quarto,
Fico absorto, sentindo a alma dolorida…
E quando adormeço…Óh! Num sonho parto
Para a materna casa, o meu raiar da vida!...

E lembra-me então meu tempo de menino,
Tempo distante já; e que nunca mais vem!
Como eu era feliz, -um risonho bambino-
Dormindo no regaço teu. Oh! Minha mãe!...

Ah! E quando cheguei à idade escolar!...
-Sinto a saudade desse tempo já vivido-
De quando tu mandaste aprender, estudar,
Este pobre infeliz, teu filhinho querido.

E aquele dia de verão? Mãezinha! E que dia,
Ficaste contentinha, tu, como ninguém!...
O teu menino bem, no exame…Que alegria
Experimentou teu peito de extremosa mãe!...

Depois como julgaste muito grande, imensa,
Crescente inteligência deste teu menino…
E nem sequer lembraste, aquela diferença,
Que sempre imprime, à vida humana o destino.

E agora desse além, muito desconhecido
Talvez tu não conheças a minha dor…Óh mãe!
Não imagines quanto, quanto hei sofrido,
Neste mísero mundo, órfão, sem ninguém.

Porém, na senda errante da fatalidade,
Eu vou deixando sempre, meu pranto correr.
Enquanto a minha alma, toda saudade,
Doces horas distantes, tenta reviver!...

E assim, na humanidade inquieta,
A um cantinho dela, o meu pobre ser.
Tentou lembrar o passado; e quis ser poeta,
P’ra como preito, uns versos te oferecer.

E eis como venceu esta dificuldade,
A minha alma pobre, que no âmago tem:
O desejo do bom Deus a sua piedade
E o anseio da tua protecção. Oh, minha Mãe!...


Ama os teus Pais



















Mimosa flôr que vais desabrochando,
Entre os afagos do maternal carinho.
Eis aqui os versos, mas aconselhando,
Que ames teus pais, - o teu ditoso ninho.

Porque depois no anoitecer da vida,
Mesmo como eu, na subida penosa.
Tu sentirás a alma dolorida,
E voarás sozinha, como mariposa…

Que rodopiando toda a sua vida,
Cai por fim morta e desiludida,
Nas fauces negras da terra voraz…

Acautela-te do traiçoeiro amor,
Porque o amor dos outros é enganador,
Como o de teus pais, jamais encontrarás.

(Poema que o meu pai de dicou à menina Lucília Celeste Caseiro).

Quadra Premiada















Essa branca capelinha
Debruçada sobre o Tua
Ampara na sua fé
A gente da minha rua.

(Quada premiada que o meu pai fez em nome das Festas de N. Sr.ª do Amparo)

Veríssimo Salvador Correia

1933-1946

sábado, 4 de setembro de 2010

Morena linda/Saudade

Poema de meu pai, acompanhado por duas estrofes minhas demonstrando a saudade imensa que reina em mim por ele.


MORENA LINDA

Tive a dita de ver, linda morena,
Teus olhos negros; negros d’ encantar.
Tua rósea boquita, mui pequena,
Feita só p’ra cantar, beijar, amar!...

Francamente, eu digo, com que pena,
Te verei partir; a alma a soluçar.
Por numa, nem sequer, conversa amena,
Este amor meu, poder-te, confessar.

Partirás – De mim algo irá contigo,
Deixarás tua neste peito amigo,
A recordação grata e sedutora!...

E mesmo quando, já depois ausente,
Inda, em canção, ouvirei ardente,
A tua voz de linda sonhadora…



Veríssimo Salvador



SAUDADE

Ao ler teus versos, ardentes, apaixonados
De saudade transbordou meu coração
Ditados por profundo amor, inspirados
Sonho daquele que com mil cuidados
Poisou sobre mim, de pai, a sua mão

Ao longe muito longe no tempo te venero
Saudoso pai que à vida intenso te doas-te
A tua memória guardo qual tesouro
Filigrana modelada no mais puro ouro
Voraz foi o tempo que por ti passou



Olema Correia

Os meus olhos teu guia

Se estou desperta

Basta que abra os olhos

E a coisa mais simples acontece

Eu vejo, reconheço as coisas

Sinto-me mergulhar

Num mundo de luz e cor.

Mas de trivial que é

Aquilo que vejo

Não me dou conta do milagre.

Mas se penso e me ausculto

Se entro dentro de mim

O incrível faz-se evidente.

Não atinjo, não atino

Na incapacidade de ver

Que a escuridão me atormenta

E a falta de luz não me apascenta

Na ânsia natural de viver.

Entretanto sinto-me ter que ver

Com algo que me é importante

E o maravilhoso acontece

Ao ver que pelos meus olhos

Outra humana criatura

Caminha com segurança

E ousado se abalança

A fazer coisas de monta

Em que ler e escrever

Porventura voltar a sonhar

Tem de relevo um lugar.



*Dedicatória ao meu companheiro de todas as horas, A. B.

Com carinho,
Olema

Ainda África

AINDA ÁFRICA

Demandei terras de Angola

Ao amanhecer do meu tempo

Era menina ainda


Por Angola me apaixonei

Por ela me fiquei

Até à idade madura


De África sorvi os cheiros

Vi a grandeza do Imbondeiro

O pôr do sol respirei


Recordo a boa gente

Do futuro a semente

O brotar de uma Nação


Lamento que a guerra

Tenha feito desta terra

Mar de destruição


Terra que se fez mártir

Deveras sacrificada

Sofrida até mais não


Houve gente que a honrou

Por ela se sacrificou

E lhe deu a sua vida


No regresso atribulado

Trouxe comigo a esperança

De lá de novo voltar




Marcas da Guerra:



Olema

Ser Mãe



SER MÃE*

Ser mãe é ser mulher

Da árvore da vida ser fruto generoso

É conhecer dos dias o amargo e o fel

Mas é saber sugar-lhes das alegrias o mel.

Ser mãe é ser entrega desinteressada

É às vezes ser mal amada

É ir buscar tempo ao tempo

Para ao filho extremoso dedicar

É exibir alegria sofrendo

É de ânsias conhecer muitas horas

Do cavalo da vida conhecer as esporas

E na dor ver sempre a esperança.

Mas ser mãe é ser fonte de ternura

É da açucena colher a doçura

A infinita capacidade de se dar.

É dentro de si em medidas sem medida

Sentir todo o poder de amar.


Olema

*Faz hoje 35 anos que dei à luz pela 3ª vez.



Gostava de citar um comentário tocante feito por CaoPoeta quando publiquei o poema acima no Luso-Poemas.


"As mães são as mais altas coisas
que os filhos criam, porque se colocam na combustão dos filhos, porque
os filhos estão como invasores dentes-de-leão
no terreno das mães.
E as mães são poços de petróleo nas palavras dos
filhos,
e atiram-se, através deles, como jactos
para fora da terra.
E os filhos mergulham em escafandros no interior de muitas águas,
e trazem as mães como polvos embrulhados nas mãos
e na agudeza de toda a sua vida.
E o filho senta-se com a sua mãe á cabeceira da mesa,
e através dele a mãe mexe aqui e ali,
nas chávenas e nos garfos.
E através da mãe o filho pensa
que nenhuma morte é possível e as águas
estão ligadas entre si
por meio da mão dele que toca a cara louca
da mãe que toca a mão pressentida do filho.
E por dentro do amor, até ser possível
amar tudo,
e ser possível tudo ser reencontrado por dentro do
amor.

HERBERTO HÉLDER



-porque não consigo dizer ou escrever o que sinto;
obrigado por seres."

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Ousado Sonho, acompanhado por ABBA




OUSADO SONHO


Eu tive um sonho
Que me encheu a noite
E se fez diáfano
Ante o manto cinza do luar.
Pela mente aquecida
De uma noite estival
Senti-me assaltada
Deslumbrada
Pela figura de um mítico Adónis
Que generosamente
Parecia ofertar-se-me
De sua Afrodite se olvidando
Sereno de mim se acercando.
Incapaz de dizer não
Ao libertino aceno
No mais intimo de mim
Floresce ébrio desejo
De a Adónis
Amorosamente me entregar.
Adversos sentimentos
Entretanto
Dentro de mim se esgrimem
Numa luta desigual
E quando a contenda
Para o mítico grego se inclina
Bonançosa aurora me desperta
Me chama à lídima razão
E num sussurro me diz:
Adónis, não.

Olema

"Partir"-Veríssimo Salvador, meu pai

PARTIR


Vais partir, vais me deixar,

Cansado já de esperar,

O amor que nunca veio.

Vais me deixar n’agonia,

Meu coração que um dia,

Amou o teu com receio…



…De que tu inconsciente,

Depois quando ausente,

Jamais m’evoques a mim.

Vás, talvez, evocar outro,

Que como eu não foi louco,

Em te amar tanto, assim…



…A modos de loucura,

Mas eu sinto a amargura,

Por tanto amor te ter.

Porque o teu amor cruel,

Por um desejo fiel,

Deixar-me-ia morrer…


Veríssimo

Nota: À memória de meu pai, que não tive já a dita de conhecer, dedico este poema de sua autoria e que demonstra o jovem apaixonado que foi.